Ainda 2 em 3 desempregados no Brasil são negros, mas há mudanças em curso e elas estão sendo aceleradas por movimentos étnico-raciais organizados que promovem o afroempreendedorismo e fazem a inclusão tecnológica
Prazer, Nina Silva!
Executiva de TI há mais de 17 anos. Uma das 100 pessoas afrodescendentes mais influentes do mundo abaixo de 40 anos de idade. Sócia-fundadora do Movimento Black Money. Membro honorário da rede Social Good Brasil, organização brasileira de tecnologia para transformação social. Mentora. Escritora. Palestrante. Todas essas frases e palavras falam sobre mim, mas é preciso muito mais que uma frase para explicar quem sou eu e os projetos que estou envolvida.
Minha rotina inclui palestras, atuação nas atividades e lançamentos do Movimento Black Money, estudos e participação em conselhos e, até recentemente, a atuação numa consultoria global de software pioneira em metodologias ágeis e centrada em tecnologia.
Em minhas palestras, costumo iniciar a fala sobre como uma menina negra nascida no Jardim Catarina, maior loteamento favelizado da América Latina (na década de 1980) chegou até a wikipedia e à lista da _Forbes_ de Mulheres Mais Poderosas do país.
A resposta é simples: voltando a ser eu mesma!
Estou extremamente honrada pelo convite da MIT Sloan Review Brasil e espero nos próximos meses compartilhar mais sobre experiências, atualidades e tendências nas áreas que navego: transformação digital e tecnologia, empreendedorismo, diversidade, futuro do trabalho, liderança inovadora, sociedade 5.0, entre outros.
Sempre me perguntam como ser uma “Liderança nas empresas”, eu devolvo a pergunta com: Como ter autonomia no mundo do trabalho com altos índices de desemprego como em nosso país e a transformação que já vivenciamos?
Acho que aí podemos começar nossa jornada …
A falta de oportunidades ao final de julho/2019 atingia 11,8% da população ativa no Brasil, cerca de 12,6 milhões de brasileiros. Em uma seara de escassez ainda nos deparamos com quanto esse problema atinge de modo mais brutal a população negra. 63,7% da população desempregada no país é preta ou parda – ou seja: de cada 3 DESEMPREGADOS no Brasil 2 são NEGROS. É hora de aprendermos a praticar o Black Money.
Com esse cenário o brasileiro continua na missão cada vez mais difícil de se reinventar.
Ao olhar para a realidade do grupo que está ativo no mercado de trabalho, a desigualdade continua: o abismo socioeconômico onde negros recebem salários 40% menor que brancos. Ponto central do início da reportagem do programa de TV _Pequenas Empresas & Grandes Negócios_ do dia 29/04/2018, que trouxe o estudo do Instituto Locomotiva onde demonstra R$ 800 bi seriam introduzidos na economia se brancos e negros recebessem o mesmo salário.
Para a população negra no Brasil o empreendedorismo muitas vezes preenche a lacuna da empregabilidade como alternativa de manutenção/geração de oportunidades e renda. Abrir o negócio próprio e valorizar suas origens e cultura é a forma como grupos investem na economia para incentivar renda entre a população da sua comunidade. Hoje, a população afrodescendente movimenta R$ 1,7 trilhão na economia brasileira, corresponde a 54% da população total (segundo autodeclarações), mas não possui incentivo para sair da situação marginalizada nos âmbitos educacionais, socioeconômicos e políticos.
Então, fazer circular riqueza intracomunidade para alavancar e trazer o grupo minorizado ao mesmo patamar de acesso e competitividade é uma filosofia que está em vários grupos étnico-raciais em todo o mundo e tem sido reconhecida na comunidade negra como a filosofia do Black Money. (Você pode entender o que é o Black Money e saber um pouco mais sobre a participação do Movimento Black Money e de outros agentes do ecossistema afroempreendedor de São Paulo no quadro abaixo e neste vídeo.)
Falar e agir sobre o prisma do Black Money é falar de sustentação de toda a pirâmide: atuando na base, incentivando o consumo consciente do consumidor negro junto ao afroempreendedor (negros são 75% entre os 10% mais pobres do país), movimentaríamos toda a estrutura. Essa estratégia de sustentabilidade e emancipação de um grupo traz maior independência e oportunidades para negros e não negros.
O Movimento Black Money tem como meta estimular a geração de negócios de modo a ampliar as oportunidades de trabalho e renda para os negros no Brasil, com base em inovação e empreendedorismo. Fazer circular capital por mais tempo dentro da própria comunidade é o nosso mantra. Somos um movimento que atua com inovação, empreendedorismo e educação financeira para a população negra. Fortalecemos o conceito de panafricanismo e temos Marcus Garvey como um dos guias, pois não reinventamos a roda apenas adaptamos práticas validadas ao contexto atual no Brasil.
No momento, o foco da iniciativa são os serviços financeiros com taxas mais justas em máquinas de cartão para dar fôlego e visibilidade a empreendedores negros. Contudo, o Movimento Black Money também trabalha a inserção da comunidade negra na tecnologia a partir da educação com cursos gratuitos e promove networking e comunicação, como o evento StartBlackUp. Números indicam que o afroempreendedorismo já é uma realidade e que só precisa de maior comunicação e alicerce da base para circulação e trocas dentro dessa rede: baseado na Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad), o Sebrae aponta que, em dez anos, a quantidade de empreendedores negros cresceu 29% no Brasil.
No segmento das micro e pequenas empresas – aquelas que faturam até R$ 3,6 milhões por ano –, o percentual de empresários negros passou de 43% para 50%. Somos os que mais empreendem mas ainda sofremos com escalabilidade e inovação tecnológica em serviços e produtos por não termos acesso a crédito e educação empreendedora.
O Movimento Black Money além do fomento das relações dentro da comunidade negra, vem à luz com denúncias e informações junto às instituições financeiras e empresariais para engajar toda a sociedade para o compromisso da diminuição das desigualdades socioeconômicas no país.”